autor: Ayrtton Fonseca autor: Bárbara Tanaka autor: Giovana Anschau autor: João Basso

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Mel na âncora

É tanta pressa
que nem com pressa
consigo apreciar o nascer do sol
a tempo.

É tanto prédio que não consigo ver
o sol se pôr.

É tanta dor e caos
ao meu redor
que não consigo socorrer ninguém.
Só correr.

É tanto vai e vem que
prefiro e fico
no meu talvez.

É tanto tudo
que preciso me sentir vazia

Mas nem tudo
e nem todo navio
se deteriora
                    no porão.

sábado, 4 de outubro de 2014

there ain't no party like a D&D party 'cuz a D&D party don't stop until the healer is dead and we've used up all our potions

we would use some dices to be cute and kinda and genius and gods
but we aren't cute
nor kinda
nor genius
not even gods
we are just kids who
like to play D&D

Palavras cruzadas

Lá estava ela. Sentada na segunda carteira da quinta fileira da esquerda para a direita, ambiente altamente ventilado, iluminação com perfeito enquadramento. Rapazes tolos à sua volta, brisa fresca, distância focal do professor. Pode ser vista de qualquer ângulo da sala, mas nenhum lugar era melhor do que o meu. Vejo seus sapatinhos azul marinho, de veludo; circundam seus pés de maneira delicada e cinderelesca. Será que o segundo artelho é maior do que o primeiro? Será que ela já fez balé e seus dedos são tortos como os meus dentes? Não importa. Só não eram mais bonitos do que a meia branca sete oitavos, que escondem as pernas torneadas como se fossem local proibido. Ah, aquelas pernas... Local proibido seria se ali houvesse cinta-liga e uma dose de espasmos. Subo um pouco mais e deslizo pelas pregas daquela saia. Me vejo segurando o que há por baixo dela, enquanto me viro ao desabotoar por trás  a camisa branca para sentir os seios pequeninos e infantos se enrijecerem com o toque de uma mão cheia de calos e vertigens eróticas. O toque é cessado após trilhar caminhos perigosos, naturalistas; percorro suas costas pálidas bem no meio de um suspiro. Observo seus ombros a uma distância atômica de meus lábios. Toco as sardas e ecoa um arrepio como instrumento musical; a resposta doce de um Miss Dior Eau de Toilette provoca minhas entranhas em um gesto lúdico. Posiciono minhas mãos sobre seus ombros e os vejo relaxar diante da massagem dionisíaca – balança o cabelo castanho amarrado por um laço vermelho. O cacho que se forma no caminho da nuca não consegue ser preso pelo laço; beijo a pintinha no lado esquerdo do pescoço e ouço a risadinha penetrar na minha alma.

"Você não passa de um garoto."

Ela não se vira, tampouco se direciona aos meus olhos. O professor volta a sua atenção a mim, e eu não volto a fitá-lo – mas volto ao meu rabisco fracassado, com traços sujos de excesso de tinta azul, deturpando o corpo dela. Pego novamente a caneta e imito o desleixo das madeixas, ajeitadas pelas mãos delicadas. 

Não enxergo se as unhas estão feitas ou não. Haja amor para imaginá-las tocando o meu rosto, a barba mal feita, as espinhas engraçadas. Mas não sei. Ela não parece ser o tipo de garota que precisa dessas coisas.