pois sempre escrevi cartas demais para amores de menos.
Procurava transcrever tudo aquilo que nunca me foi sentido
em uma página única em escrita fina e itálica, negra como
um objeto qualquer do neoconcretismo, vivendo romances
à la Truffaut e surrupiando construções metafóricas de caráter
um tanto quanto modernista, cientificista, astronômico ou
meramente lunático em uma poção da metafísica do amor.
Não era tudo isso. As palavras eram cruas e mal vestidas,
porque não há poesia que carregue o fardo da inexperiência
até que alguém seja bombardeado por milhões de partículas
que transformem a poesia em corpo e curva. Pois agora seriam
lábios cerrados que construiriam os versos, e não mais palavras.
Ah, meu amor, a vida era mais leve e sem aconchego, sem colo
para dar, sem calor para sentir, sem o arrepio da pele estarrecida
e sem a dúvida e a perplexidade e a insegurança que nos enterram.
A gente nunca sentiu o copo vazio porque ele nunca havia sido
servido, não? E porque às vezes é tão difícil retornar, porque o
mundo é tão grande lá fora e há uma infinidade de medos que
provocam as minhas entranhas, sem licença para entrar ou aviso
ao sair. Me desculpe... Não consigo por ora enfrentar a
velocidade com que os dias passam, mas eu só escrevo cartas
e procuro os resquícios do amor espalhados pelo espaço.
E não se trata de ter fôlego, mas de saber o que dizer ou saber
o que sentir. E eu sei que você também não sabe. Ninguém é
sério aos dezessete anos. Então eu continuo escrevendo sobre
você para o amor, que é o que vem me buscar dos retratos
p a r n a s i a n i s t a s e me joga ao naturalismo do teu ser,
que é melhor do que qualquer espécie literária que eu poderia
pensar em escrever.