autor: Ayrtton Fonseca autor: Bárbara Tanaka autor: Giovana Anschau autor: João Basso

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

"Mas"

Eu aproveitei que tinha milhares de créditos no celular e liguei pra desejar um feliz natal a todos, mas não tinham muitos números na minha agenda.
"Eu tô falando, cara, vou escrever um texto enorme pra ela dizendo tudo o que eu sinto."
E ele me olhou meio torto, como se não fosse uma boa ideia. De fato não era, mas sempre fui muito profundo em qualquer coisa.
Aí eu liguei, mas não era para desejar um feliz natal. Era pra conversar.
"É que eu não entendo o que você quer, saca?"
"Ai João, o problema é que você fica o tempo todo me colocando na parede, sabe? Eu não consigo respirar."
Eu ri, mas ri de nervoso.
Depois que desliguei, era óbvio que eu iria fazer aquela presepada toda.
Às vezes me sinto muito burro. Muito, mas muito burro.
Mas
"Se arrependimento matasse, eu estaria vivão."
No texto eu realmente escrevi tudo o que sentia, mas meu pior erro foi ter nascido em 97. Não se sabe o que é o que quando se é inteligente demais pra sua época.
"O João é homem pra casar."
"Então casa comigo."
Silêncio.
Eu ainda lembro de você, eventualmente. O engraçado é que lembro só das coisas que fiz e não das coisas que você fez. Hoje, não tenho muita vontade de te ver e, se visse, provavelmente iria agir estranho. Espero que entenda.
Deus, eu queria tanto ainda ter as coisas todas naquele celular. Iria rir por tantas horas.
E mais: você era muito feio, João. Puta que pariu.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

{ Prometa que só vai ler quando estiver muito triste }

É como se o espaço gritasse. Como se todos os átomos do meu corpo vibrassem na mesma frequência (40Hz). Todos os músculos que compõe o meu coração pulsam com a rigidez dos ombros de um general de guerra pronto pra dar sua ordem mais importante.

É incrível ver a população do deserto em que me encontro rindo de mim, fazendo me sentir tão estúpido que quero morrer. E não me resta água. Não me resta alimento. Não me restam razões para continuar. Num ímpeto talvez imbecil, passo a comer da minha carne. A população do deserto zomba de mim, fazendo com que me sinta tão asqueroso que quero morrer. Mas não posso morrer agora.

Me levanto e me odeio. Odeio qualquer nome pelo qual já fui chamado. Odeio qualquer palavra que já disse. Odeio qualquer sentimento que já tive. Quero que tudo desapareça, mas quanto mais penso em odiar, mais a escuridão me corrói. Sinto medo por um segundo, mas lembro que você já não existe mais. Você e tantas outras pessoas já viraram cadáveres nesse imenso deserto em que me encontro. Ponho-me a agradecer por terem me mantido vivo durante todo esse tempo. Paralelo a isso, venho a xingá-los por terem me deixado com tanto ódio acumulado dentro de mim. Tremo, mas não é de frio. São essas vozes que continuam me subindo à cabeça e me dizendo coisas que eu já sei, mas me nego a acreditar. Enquanto o vento uiva em meus ouvidos, me pego pensando em tudo o que você falou sobre energias cósmicas. Não dei atenção, no momento, pois estava muito ocupado acompanhando o movimento dos seus lábios.

Palavras soltas encaixaram em minha cabeça nesse exato momento e tento lembrar da entonação de sua voz. Nada. Somente palavras manuscritas e mal escritas organizadas por parágrafos entrando em minha mente.

É noite, mas não posso dormir. Faltam-me pedaços, mas não posso parar. Tenho que sair desse deserto. Continuo caminhando. Norte, sempre norte. Algum dia chegarei a algum lugar.

E eu nunca quis ser assim. Me odeio. Caminho, mas me odeio. Sobrevivo, mas me odeio. Enxergo, mas me odeio. Deixei você ir e me odeio. Paro para descansar. Não seria humanamente possível caminhar tanto, eles dizem. Sabem de tudo, mas me negam a informação. Não dizem como posso sair deste deserto. Sinto arrepios.

Descanso. Durmo. Falho. Sonho. Você e eles.
Eles, sempre eles.
Só você e eu.
Ele, de mais de 30 palmos de altura, arisco, desafiador, verde e limpo. Clássico, eu diria. Infinitamente elegante, em sua rebeldia.
Facada pelas costas.
Joelhos no chão.
Lágrimas e sangue também.
Remorso.
Eu sinto muito. Sinto tanto.
Ele e seus menos de 10 palmos. Ciente, ágil, concentrado. Sombra, apenas um sombra. Ou então eu achava que era.
Você tentou me roubar, amigo. Então roubarei de ti.
Caso indefinido.
Acordo. Sonho estranho. Lágrimas nos olhos. Quero sumir. Eu me odeio. Me odeio tanto.
Você não devia ter feito isso comigo. Eu não deveria ter deixado tudo isso acontecer.

Ponho-me de pé, mas minha mente luta. Ela mesma não quer continuar. Mas sou eu que mando e não o contrário. Já tratei de me livrar de alguns de vocês e não hesitarei em outros. Arrisco dizer que vocês não serão corajosos o suficiente para chegar muito perto.

Suicídio? Não. Continuo andando.
Sombra. Aflição. Ando mais rápido. Corro. Grito. Choro alto. Fujo, mais uma vez.
Queria deixar claro que não sinto medo, mas falhei. Fugi como um pequeno cachorro que se mostra valente.
Ofego. Não deveria estar ali. Por que diabos estava ali? Há quanto tempo?
Olhar pra cima, isso. Sempre olhar pra cima.
Estava ali tempo o suficiente para saber demais.
Não pode ser.
Morte? 
Me diz uma coisa.
Morte?
Morte?
Morte?
Me responda.
Morte?
Morte?
Você está com medo.
Morte?
Não, não resolve.
Morte?
Eu tenho medo. Eu tenho muito medo.
Por favor, me ajude.
Por favor.
Sumiu.
Sinto-me leve de novo.
O tempo é relativo, mas me ponho a caminhar de novo. Cada vez mais cansado, cada vez cogitando mais e mais a possibilidade de desistir.
Suicídio? Não. Caminho mais.
Você sabia. Sempre soube. Nunca ficava sem saber.
Eu precisava tanto assim de você?
Sim.
Meus olhos ardem. Quero arrancá-los.
Não.
Siga em frente.
Metas. Sempre elas. Extorquindo minha mente. Ouviu bem, cara? 
Não poderei parar até a numerologia fechar em número par.
Tô cansando. Não posso trocar. Tenho que seguir firme.
Atenção aos detalhes? Sempre.
Memória fraca, mas interessante.
Vou perder assim que te alcançar. Vou querer demais, como sempre faço. Eu me conheço. Eu sou assim.
Você, por sua vez, sempre ganha. Sempre ganhou.
Me perdi. 
Mais 
uma
vez.

Não posso desistir.
Está tudo bem agora. Mas a sombra está lá. Ela vai me pegar.
Medo.
Eu sinto muito. Sinto muito mesmo.
Você ainda chora? Sim.
Você ainda sente? Sim.
Não quero saber. Ok.
A cada passo na areia, você arrisca seu futuro.
Sente ódio? Não. Você se sente mal? Sim.
E eu sinto muito. Muito mesmo. 
Pra que continuar? Onde vamos parar? Vamos parar?
Você me passa pela cabeça novamente. E tem sido só você. Só e somente.
Tudo o que eu queria era você. Preciso de você.
Eu sinto muito pelo que fiz. Muito mesmo.
Não foi o suficiente. Adeus.
Não vou mais caminhar.
Suicídio? ...
Não. Não. Não.
Eu me odeio. Me odeio muito.
Suicídio? Relativo. Deixe.
A sombra é sua. Leve-a. Ria, como eles fizeram. Xingue, como eles fizeram. Minta, sempre minta. Não esqueça dos detalhes.
Suicídio? Plausível. Lembre.
Não é opção. Sempre foi a minha vez. 
Pronto. Atormentado e pronto. 
Medo. 
Não, agora não.
Não agora.
Por favor, não.
Corra.
Corra mais.
Seja mais do que já é.
Ele está vindo.
Tente vencer.
Não.
Desista.
Acabou.
Isso é um adeus.
É a metade, mas ainda assim um adeus.
Sempre deixa marcas.
Não é mais sobre ele. É sobre eu. E sobre eu não suportar. Não caber dentro de mim.
Me mate. 
Sabia.
Suicídio? Na minha maneira.
Dor.
Enjôo.
Barulho.

Chuva. E por pouco não vou conseguir.